O estojo vicentino é
uma peça numismática cercada de dúvidas e suposições. Colecionadores e
comerciantes não são unânimes quando questionados a respeito desse estojo que
inauguraria em pleno Estado Novo a era de moedas de coleção em estojo exclusivo
para colecionadores. Oitenta e seis anos após o lançamento, o numismata Emerson
Pippi, membro da Associação Numismática Paranaense conseguir reunir documentos
e depoimentos que buscam provar a autenticidade, oficialidade e quantidade
desta peça tão controversa.
Em virtude das
comemorações ao quarto centenário da colonização do Brasil, a Casa da Moeda
cunhou, em 1932, o conjunto de seis moedas, que viria a ser a famosa Série
Vicentina, sendo estas as primeiras lançadas na era Vargas. Algumas séries
foram acomodadas em belo estojo de madeira, com a imagem da Casa da Moeda
estampada em sua tampa.
Periodicamente essa
peça aparece em anúncios ou fóruns numismáticos. As perguntas, que
invariavelmente acompanham essas citações, são respondidas com especulações.
Não há certeza absoluta nas informações sobre a peça.
Uma publicação no
Diário Oficial da União, no dia 13 de outubro de 1932, página 9, prova que o
estojo é oficial da Casa da Moeda do Brasil.
O expediente do
Ministério da Fazenda, em requerimento despachado pelo Diretor Geral do Tesouro
Nacional ao Diretor da Casa da Moeda, diz:
Comunicando que o Sr.
Ministro resolveu permitir que sejam vendidas diretamente pela Casa da Moeda as
pequenas caixas de madeira contendo uma série completa das moedas divisionárias
comemorativas do 4º centenário do inicio da Colonização do Brasil, devendo a
mesma repartição incluir o produto da venda das moedas no total dos suprimentos
que forem feitos à Tesouraria geral do Tesouro Nacional.
Essa publicação
descreve pequena caixa de madeira, ou seja, não são caixas comuns usadas para
transporte das moedas. Também menciona que contém uma série completa das
moedas, não deixando dúvidas que acomodam uma unidade de cada tipo de moeda da
série.
No início pensamos que
os estojos foram oferecidos para autoridades da época, mas o Diário Oficial
informa que foram colocados à venda, talvez sendo uma sobra daqueles
distribuídos inicialmente. Logicamente não é possível saber se foram realmente
disponibilizados ao público ou reservados para colecionadores e amigos, mas é
clara a designação que o dinheiro resultante da comercialização integraria o
caixa do Tesouro Nacional.
Esse documento
corrobora a tese que o Estojo Vicentino é oficial da CMB, e de conhecimento
inclusive do Ministro da Fazenda, o ilustre Sr. Osvaldo Aranha.
O texto foi também
reproduzido em jornais da época, como o Diário de Pernambuco:
Há duas versões das
caixas que são reconhecidas como originais. Isso aconteceu porque dois
fornecedores diferentes confeccionaram os estojos para a CMB. Os dois tipos são
bem parecidos, em formato arredondado.
O Primeiro modelo
Um dos modelos tem 13,8
cm de diâmetro e 2,3 cm de altura. Feito em madeira avermelhada de jacarandá, a
tampa possui um sistema de fechamento em rosca com ¼ de volta. No centro da
tampa, há uma belíssima gravação redonda com 5 cm de diâmetro, com a inscrição
“Casa da Moeda Brasil” e uma imagem da fachada principal do antigo prédio dessa
instituição no Rio de Janeiro.
O Estojo é parte do acervo Diniz Numismática - O estojo foi restaurado em 2014 |
O Estojo é parte do acervo Diniz Numismática - O estojo foi restaurado em 2014 |
O Estojo é parte do acervo Diniz Numismática - O estojo já restaurado em 2014 |
O Segundo modelo
Dento do estojo, há
seis nichos para o encaixe das moedas da série. O tamanho dos entalhes é
perfeito e ainda há uma pequena cavidade para facilitar a retirada de cada
moeda. A disposição delas é circular, com a de 400 réis colocada no centro. Curiosamente,
parece que falta uma peça para fechar o círculo. Temos a impressão que foi
deixado espaço para mais uma moeda, ou talvez uma medalha.
Outras informações
A segunda versão é
similar, mas foi feita em madeira mais escura, com acabamento melhorado nas bordas
e ao redor dos nichos. Nesse modelo as moedas estão dispostas em círculo
fechado, mantendo a de 400 réis no centro. Aqui não há cavidade para auxiliar o
manuseio das moedas.
Caminhando para a confirmação
Depoimentos foram
colhidos a respeito do estojo, e isso reforça a importância de sua
autenticação. Figuras importantes da numismática brasileira tem opiniões
conflitantes.
O numismata Antônio Tomaz, sócio-fundador da
Sociedade Numismática Paranaense, levanta dúvida em relação à produção ter sido
feita a mando da Casa da Moeda: “Após a série vicentina, só houve lançamento de
moeda em estojo no ano de 1972, e mesmo assim não era de madeira”, diz. Segundo
Tomaz, há possibilidade da caixa ter sido feito paralelamente, sendo uma falsa
da época, no intuito de acomodar as recém-lançadas moedas comemorativas.
O Ex-presidente da SNP, Denis Renaux
discorda. Ele afirma que o estojo é oficial da CMB e ainda discorre sobre a técnica
de gravação no jacarandá. A imagem da tampa não é entalhada. Eles esquentavam a
madeira e faziam a cunhagem. Era um método impressionante para a época.
Após a confirmação da
oficialidade, temos outra importante questão: Quantos estojos foram feitos?
Sabemos que a quantidade é somente um dos fatores que compõem o valor de uma
moeda ou conjunto. O estado de conservação, a lei de oferta e procura e a
história por trás do objeto também formam a avaliação. Ainda assim, a
quantidade é elemento primordial para sabermos o grau de raridade e escassez de
uma peça numismática. Sem essa informação voltaremos ao nível das especulações.
Chegamos então ao
Catálogo das Moedas Brasileiras de Kurt Prober.
Na página 170 da terceira edição, de 1981, ele menciona:
“Quer me parecer que 214 era a quantidade de estojos oficiais
feitos na C. da Moeda para êstes jogos”.
A publicação e citação
do estojo por Prober valida a sua autenticidade, além de confirmar a quantidade
produzida. O alemão é um dos pais da numismática brasileira e jamais publicaria
algo sem ter fonte e embasamento. Cláudio Amato, co-autor do “Livro das Moedas
do Brasil” endossa a afirmação de Prober:
“Se
Kurt Prober tivesse alguma dúvida quanto a uma informação preferiria não
escrever do que passar a informação errada”.
Amato também confirma a
existência oficial do estojo, mas não possui estudos mais profundo sobre a temática.
O próximo passo para
que este imbróglio seja enfim solucionado, passa a ser responsabilidade dos
autores de catálogos numismáticos brasileiros. Ao publicarem em seus catálogos esse
importante exemplar da história numismática. Estarão prestando um grande
serviço ao que tange a informação dos que amam a arte numismática. A inclusão e
descrição evitaria a falsificação e solucionaria as dúvidas que cercam o estojo
das vicentinas, além de dar-lhe o devido valor de mercado e fundamentalmente
histórico.
Fontes e referencias:
- Estojo vicentino - Artigo
de autoria de Emerson Pippi, associado da Associação Numismática Paranaense
- Adaptações, Bruno
Diniz
- Catálogo das Moedas
Brasileiras, Kurt Prober, 3ª edição, 1981
- http://www.moedasdobrasil.com.br/
– Eduardo Rezende
- Diário Oficial da
União, edição de 13/10/1392, página 9.
- Diário de Pernambuco,
edição de 21/10/1932.
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