Em 1860, um jovem
mato-grossense de apenas 12 anos, iniciou uma viagem de sua cidade natal,
Cuiabá, para a capital do então Império do Brasil, Rio de Janeiro. Seu maior
objetivo era estudar e se formar, nada fora do comum para um filho da
oligarquia imperial. O menino seguiu seu sonho no lombo de uma mula através do
sertão, transpondo rios a nado e sofrendo todos os rigores de uma viagem do
interior ao litoral. O Brasil ainda ostentava matas e florestas exuberantes,
mas muito difíceis de serem transpostas mesmo com o auxílio de algumas
ferramentas. O alivio só vinha nos trechos onde já haviam estradas abertas. A
viagem durou cerca de três meses e o nome do jovem? Joaquim Duarte Murtinho
(1848-1911).
Após Estudos
Preliminares, Mutinho ingressou na Escola Politécnica, no entanto, não Se
Tornou engenheiro, mas um dos mais disputados Médicos homeopatas do Rio de
Janeiro. Com a Mudança do Regime imperial para o republicano, acabou entrando
para a Política, foi Senador da República nos seguintes mandatos; 1890-1896,
1903-1906-1907 e em 1911 também foi Ministro da Fazenda do Presidente Campos
Salles (1898-1902). Murtinho foi um dos Homens mais ricos e influentes de sua época,
era solteiro e nunca constituiu uma família.
Na política fez muitos
inimigos, entre eles estava o deputado sergipano Fausto Cardoso. No passado e
nos tempos atuais, fazer inimigos na política é decretar que algo ruim irá
acontecer a qualquer momento. Assim, entramos de vez em nossa história.
Agora passamos a
descrever o que de fato aconteceu, pois provavelmente teria sido um dos maiores
escândalos da época, e que ainda provoca discussões no âmbito da história e da
numismática.
Por volta de 1890-1892,
Joaquim Murtinho então com pouco mais de quarenta anos de idade, ocupa o posto de
Senador da República, onde encarregou o jornalista Artur Guaraná, que fazia uma
cobertura de assuntos econômicos pelo país, de lhe auxiliar na procura de uma
jovem para servir de modelo na confecção da futura cédula de 2 mil-réis do
Tesouro Nacional.
A estampa da cédula de
2 mil-réis em Circulação na Época (8ª estampa) havia sido aproveitada do
Império, substituindo-se a efígie de D.Pedro II Pela Alegoria da Justiça, mas
agora se pretendia substituir a antiga efígie, para que isso fosse possível,
procurava-se a imagem de uma bela jovem, com características da típica mulher brasileira
para representar a figura da República.
O jornalista realizou algumas
buscas até encontrar em estúdio fotográfico uma fotografia de uma bela jovem
deixando seu verdadeiro nome em sigilo, referindo-se a moça somente por
"Sinhazinha". Ela vivia com o sua mãe e colaborava com Jovens poetas
e prosadores de São Paulo onde também ajudava com o Diário Popular e outros
periódicos de pouco apuro literário.
Ela então aceitou o
convite e viajou para o Rio de Janeiro onde em seguida rumou para a Europa. O
envolvimento amoroso da jovem com Joaquim Murtinho Parece ter ficado
evidenciado nesta viagem.
Na Europa, a jovem, após
ter passado por Lisboa e provavelmente por Paris, dirigiu-se para Viena, onde
foi apresentada ao pintor Conrad Kiesel (1846-1921) para que este pudesse
realizar os retratos que seriam utilizados na futura cédula. O pintor realizou
vários ensaios, entre eles "Dolores" e "Saudade" alegorias
que seriam em seguida encaminhadas aos Estados Unidos, mais precisamente para a
ABNCo, onde procederia com a realização das gravuras necessárias para a
confecção das cédulas.
A ABNCo. encarregou o gravador
Japonês Sukeichi Oyama (1858-1922), que era funcionário da empresa (1891-1899),
de efetuar as gravuras. O senhor Oyama realizou ao menos duas gravuras que
seriam utilizadas na confecção das cédulas brasileiras, uma denominada
"Zella" (1893), obtida a partir do retrato tirado por Conrad Kiesel e
denominado "Saudade", e a Outra, "Mima" (1894) obtida também
por retrato tirado por Conrad Kiesel e denominado por ele como
"Dolores".
2.000 MIL RÉIS - ESTADOS UNIDOS DO BRAZIL 1899 |
2.000 MIL RÉIS - ESTADOS UNIDOS DO BRAZIL 1918 |
Era praxe na ABNCo, que
os artistas utilizassem gravuras a partir de retratos e ensaios para
confeccionar notas em várias partes do mundo. "Zella", primeiramente,
foi utilizada em três oportunidades, há notas de 20 Dólares de 1897 (PS627) do
Bank of Nova Scotia (Província da Nova Escócia - Canadá), notas de 20 pesos de
1898 (PS180) de El Banco de Concepción (Chile ) e notas de 100 pesos, também de
1898 (PS199) de El Banco de Coahuila (México).
Em 1900, finalmente, a
gravura "Zella" seria utilizada em uma cédula brasileira, a de 2
mil-réis de 1900, da 9ª estampa do Tesouro Nacional - R082; P.11. Onde acabou por
causar um grande furor na Câmara dos Deputados, Sendo o Ministro da Fazenda
acusado de reproduzir a figura de sua "meretriz" em dinheiro em do
Estado.
PERSEGUINDO
A VERDADE – Alguns documentos
oficiais da época trazem as seguintes informações de acusação na Câmara dos
Deputados:
Na Sessão de 6 de
setembro de 1900, o Deputado sergipano Fausto Cardoso (inimigo de Murtinho), em
linguagem um tanto quanto rebuscada, relatou a suposta manobra de Murtinho para
colocar nas notas brasileiras a imagem de sua “meretriz” como era chamada por
alguns membros do parlamento.
O
TESTEMUNHO DA HISTORIOGRAFIA -
Em 1990, o historiador José Murilo de Carvalho na obra “A Formação das Almas: O
Imaginário da República no Brasil”, na parte que diz respeito ao caso da
alegoria feminina representando a República, nos ofereceria sua visão e a
lembrança do fato. (Em, A Formação das Almas :. O imaginário da República no Brasil José
Murilo de Carvalho São Paulo:. Companhia das Letras, 1990, p 0,88 / 89).
Em 1996, o historiador
Fernando Antonio Faria, retomaria o mesmo assunto na obra “Arquivo das Sombras:
A Privatização do Estado brasileiro nos anos Iniciais da Primeira República”.
No livro ele relembra o fato e discorre sobre a suposta relação promiscua de Murtinho
com o dinheiro.
Vinheta,
Denominação, Dados e Inspiração - C-515
Zella 12/1893 retrato "Saudade" de Conrad Kiesel / C-537 Reverie 5/1894 Pintura de Paul
Thumann de - "Os Destinos" / C-538
Mima 1894 retrato "Dolores" de Conrad Kiesel.
ZELLA
- A gravura
"Zella", vimos ser utilizada em ao menos cinco oportunidades,
vejamos:
20 Dólares de 1897
(PS627) do Bank of Nova Scotia (Província da Nova Escócia - Canadá).
20 pesos de 1898
(PS180) Fazer El Banco de Concepción (Chile).
100 pesos de 1898
(PS199) de Fazer El Banco de Coahuila (México).
2 mil-réis de 1900,
(P.11; R082) 9ª estampa do Tesouro Nacional (Brasil)
2 mil-réis de 1918,
(P.13; R084) 11ª estampa do Tesouro Nacional (Brasil)
MIMA
- A gravura "Mima"
foi utilizada em ao menos duas oportunidades, vejamos;
1000 Dólares
(certificado de ações) de 1895 da New Orleans & Western Terminal RR -
Estados Unidos.
500 pesos de 1897/1898
(PS200) de Fazer El Banco de Coahuila (México).
REVERIE
- A gravura
"Reverie" foi utilizada em diversas oportunidades, vejamos:
Série de bilhetes da
Caixa de Estabilização (R184-190; P.103-109) - Brasil.
50 Dólares Fazer
Merchants Bank of Canada (PS 1163) - Canadá.
1000 Dólares
(certificado de ações) de 1906 da Cidade de Cincinati - Estados Unidos.
1000 Dólares
(certificado de ações) de 1901 Fazer Newport News & Old Point Rwy &
Eletric. - Estados Unidos.
10 centavos (Bonus de
consumação) Fazer amigos de Consumidores de 1973 - Estados Unidos.
"Zella", gravura de Sukeichi Oyama (1893), NAS DIVERSAS cédulas foi reproduzida Onde, na TEMOS Sequência: 20 Dólares de 1897 (anverso) Fazer Bank of Nova Scotia, Canadá (PS627), 20 pesos de 1898 ( reverso) Fazer El Banco de Concepción, Chile (PS180), 100 pesos de 1898 (reverso) do El Banco de Coahuila, México (PS199), 2 mil-réis de 1900 (anverso) do Tesouro Nacional, Brasil (P.11; R082) e 2 mil-réis de 1918 (anverso) do Tesouro Nacional, Brasil (P.13; R084).
Mima, gravada POR Oyama, certificado de ações da New Orleans & Western RR Terminal de 1895, Estados Unidos; Mima, 500 pesos de 1897/1898 (reverso), PS200, Fazer El Banco de Coahuila, México;?, 200 mil-réis de 1908 (reverso), (R147; P.76) do Tesouro Nacional, Brasil; Reverie, 10 mil-réis de 1926 (anverso), (R184; P.103) da Caixa de Estabilização, Brasil e Reverie , 100 mil-réis de 1909 (reverso), (R136; P.65), do Tesouro Nacional, Brasil
Das cédulas brasileiras
do mil-réis que existem referentes ao período republicano apenas três imagens que
representam a República não fazem menção ao clássico modelo representando a república
com o barrete frigio. Estas imagens são: "Zella",
"Reverie", ambas do gravador Sukeichi Oyama, também temos uma que se
encontra na cédula de 200 mil réis de 1908 da ABNCo, que desconhecemos a
autoria, mas que pode ser a mesma jovem das outras notas devido as semelhanças
das figuras retratadas.
Pintura de Conrad
Kiesel denominada
"Senorita" de 1885;
Retrato do autor que também retratou "Dolores", e que foi utilizado
por Sukeichi Oyama para a realização da gravura "Mima"
Não Podemos afirmar com
certeza que a gravura da cédula de 2 mil-réis de 1900 foi um pedido ou determinação
do então Ministro da Fazenda Joaquim Murtinho. Nem mesmo podemos afirmar que a
moça retratada na nota seria uma meretriz de fato ou uma amante de Murtinho,
pois o mesmo era homem livre para se relacionar e não tinha família constituída.
O ar de boato político alimentado pelas desavenças com outros parlamentares
pode ter sido a tônica para que a história ganhasse contornos reais tanto no
parlamento quanto na historiografia.
A viagem com a moça
pode ter acontecido, e colocar a imagem dela no dinheiro nacional me parece uma
excentricidade de um conquistador, atitude semelhante aquelas que políticos fazem
atualmente quando querem favores femininos em troca de outros favores.
O papel da empresa que
desenvolve um trabalho é agradar seu cliente e não contestar fontes ou ter em
seus arquivos a origem de cada ideia executada por ela.
Não podemos condenar
Murtinho ou mesmo precisamente identificar a jovem, mas podemos afirmar que o
fato flutua entre o conto e o real entre a história e a estória...
Bibliografia
- A Formação das Almas: O Imaginário da República no Brasil. José Murilo de Carvalho. São Paulo: Companhia das Letras, 1990.
- Arquivo de Sombras: A Privatização do Estado brasileiro nsa ano Iniciais da Primeira.República. Fernando Antonio Faria Rio de Janeiro, Sette Letras, c.1996.
- Bilhetes Bancos Particulares y Republica de Chile Impresos POR American Banknote New York -. 1865-1920, Coleccion Arte, s / d.
- Boletim da Sociedade Numismática Brasileira (SNB), n ° 50, São Paulo, 1976.
- Boletim da Sociedade Filatélica e Numismática de João Pessoa (SFNJP), n ° 68, 2001, p.4.
- Brasil:. Congresso. Nacional Anais da Câmara dos Deputados V.5, Rio de Janeiro, 6 de setembro de 1900, p.144-145.
- Catálogo J. Vinicius de cédulas do Brasil. Cédulas do Brasil de 1773 hm 1980. José Viera Vinicius do Amaral. São Paulo, 1982.
- Catálogo do Papel Moeda do Brasil, 1771-1986, Emissões Oficiais, Bancárias e Regionais. Violo Idolo Lissa. Brasília: Ed. Gráfica Ltda Brasiliana, 3ª edição, de 1987..
- Cédulas Brasileiras da República - Emissões do Tesouro Nacional. O Banco do Brasil SA Rio de Janeiro, 1965.
- Cédulas do Brasil 1833 hm 2003. Cláudio Amato, Irlei S. Neves, Julio E. Schütz. São Paulo, 2003.
-. Dinheiro no Brasil F.. Dos Santos Trigueiros Rio de Janeiro, 2ª edição, Léo Cristiano Editorial, 1987.
- Banco Internacional Nota Society Journal (IBNS - Jornal), Volume 40, nº2, 2001, p. 8-27.
- Levantamento do Meio Circulante ano between OS de 1889 (Proclamação da República) Até o ano de 1904 Paragrafo O Filme Sonhos Tropicais. Marcio Rovere Sandoval. Florianópolis, 2002. (publicado NAO).
-. Nosso Século, 1900-1910 São Paulo: Abril Cultural, 1980).
- Catálogo Padrão de Dinheiro do Mundo de Papel - temas. Especializados Editado POR George S. Cuhaj, 10 th edição, vol. Da UE, EUA , 1170 p., 2005.
- Catálogo Padrão do Papel Moeda do mundo - Problemas Gerais. (1368-1960) Editado POR George S. Cuhaj, 12 th edition, EUA , 1224p., 2008.
- O Scotia Bank História - A história do Banco de Nova Escócia , 1832-1982. Joseph Schull e J. Douglas Gibson. Toronto , 1982.